sexta-feira, 27 de novembro de 2015

PARANÓIA


PARANÓIA

                

                 Numa das minhas viagens ao complexo de alumínio, em Barcarena, Pará, fiquei hospedado no hotel Sumaúma, na Praia do Caripy.  O hotel tem uma unidade de apartamentos construído no topo de uma sumaúma, maior árvore da Amazônia. Essa construção é toda em madeira, um belo projeto arquitetônico integrado ao meio ambiente.  Ficaria lá hospedado por trinta dias, substituindo um colega que entrara de férias.  Em frente ao hotel, estende-se a bela praia do Caripy, no rio Pará, de onde se divisa a ilha de Marajó quilômetros a perder de vista. O rio Pará,  um afluente do rio Amazonas, chega à foz  pelo lado direito da ilha de Marajó enquanto o rio Amazonas abraça a ilha pela esquerda.  Uma vez alojado, fiquei sabendo que houve um roubo de cabos telefônicos, deixando o hotel isolado do resto do mundo. Ficamos incomunicáveis por dois dias. Na recepção me informaram que era comum esse tipo de roubo e pediam que quem visse alguém subindo nos postes entrasse em contato com o hotel ou com a concessionária.

                 Fazia eu minha caminhada de exercício diário quando me deparei com um ladrão em ação no topo da escada com um alicate tentando cortar os fios de um poste. Não havia mais ninguém na estrada a quem pudesse pedir ajuda.

                 Resolvi agir sozinho e falei para o fulano:

                 — Desce daí!

                 Ele olhou para baixo e fez que não era com ele. Insisti, agora berrando:

                 — DESÇA DAÍ!

                 — Não enche o saco, respondeu com rispidez.

                 Comecei a me irritar e me lembrei de um conselho que meu avô me dera quando ainda criança:

                 “Nunca saque o revólver se você não tiver certeza de que terá coragem de atirar.”

                 Não estranhem essa máxima do meu avô, mas ele era do tempo em que se andava armado, resquícios de suas peripécias pelos sertões mineiros.

                 Estava eu diante de uma situação real e o conselho do meu avô a martelar-me o cérebro. Eu já tinha sacado a arma (Desça daí). Agora era acovardar-me ou ir em frente.  Não pensei duas vezes.

                 — Desça daí, senão jogo você e a escada no chão — bradei.

                 — Vá se f.... — respondeu-me também enfezado.

                 Meu sangue ferveu e atraquei-me com a escada, comecei a sacudi-la, até que ele caiu lá de cima como um coco maduro. Só tive o tempo de recolher o pé antes que ele se esborrachasse no chão. Ele levantou-se rápido e me acusou:

                 — Você é louco, olha o que você fez, olha o que você fez...

                 — E o que foi que eu fiz? Hein, o que foi que eu fiz?

                 Só então notei o carro da concessionária na curva da estrada.




—Desce daí senão vou jogar você e escada no chão!


                 Ficou me olhando fixo sem acreditar no que estava acontecendo, deve ter concluído que eu era um doido varrido.

                 Achei melhor retornar à minha caminhada. Quando peguei a chave do apartamento ainda cantei de galo para a recepcionista:

                 — Acabei de evitar um roubo de fio de telefone.

                 Ela ficou me olhando encantada e para evitar emoções mais fortes retirei-me para meus aposentos. (março/2004)


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