TIVE UM SONHO, MELHOR, UM PESADELO
Mulla: - Papa, Torquemada quer me queimar vivo. Papa: -Você merece Mulla, você merece. |
Transcorria o
ano de 1470 e os inquisidores da Santa Sé, que tinham sido expulsos da
Alemanha, encontraram terreno fértil em Portugal e na Espanha onde Fernando de
Aragão e Isabel de Castela estenderam sua soberania, com as bênçãos do
Vaticano.
Vi-me,
de repente, participando do Tribunal da Inquisição do Santo Ofício julgando uma
pessoa, que a princípio me pareceu Jesus, com sua barba atingindo o peito, os
cabelos esvoaçando, olhar arrogante de quem se achava o melhor e o maior,
orelhas de abano, nariz adunco e uma barriga protuberante.
Com
o crucifixo à mão, Torquemada o acusava de organizar o caixa 2 na igreja em
Espanha.
O
acusado teimava em dizer que não sabia de nada, que não ouvira nada, e que nada
fora provado.
Eu
detestava o Torquemada, também não me simpatizava com o acusado, mas mesmo
assim saí em sua defesa.
—
Torquemada, não é justo condenar um cristão-novo que não sabe de nada!
Surpreso,
Torquemada me encarou e me acusou de ter tentado salvar a bruxa de Rouen da
fogueira (referia-se a Joana D’Arc). Voltou ao ataque:
—
Ele se diz o Messias, trata-se de um herege, destilou seu fel.
—
Nisso você tem razão, respondi.
—
Ele diz ter descoberto um novo país, as terras de Vera Cruz.
O
acusado, com voz trôpega conseguiu balbuciar:
—
Vou chamá-lo de Brasil.
—
Então vai para a fogueira por suas heresias — agitou o crucifixo em direção ao
cristão-novo, amarrado a um madeiro tendo aos pés uma pira.
Sentindo-me
responsável em dar combustível para a fogueira de Torquemada, lancei um último
repto:
—Torquemada,
tens coragem de condenar à fogueira quem não sabe ao menos o que é heresia? —
tentei apelar ao bom senso, coisa que o inquisidor-mor do Vaticano não tinha.
Com
os cenhos franzidos e olhar destilando ódio, Torquemada redarguiu:
—
Estás a dizer que o herege é analfabeto?
—
Sim, respondi timidamente.
— Em nome do Santo Oficio ordeno sua
internação no convento até completar a alfabetização — determinou Torquemada.
—
Não, isso não, — implorou o condenado-, mil vezes a fogueira.
Voltou-se
para o povaréu que queria ver carne assando na pira:
—
Quem vocês preferem que queime no inferno: Mulla, o analfabeto, ou Bardoso, o
arrogante?
E
o povo em coro: Mulla, Mulla.
Sai
em defesa da Mulla, isto é, do Mulla e gritei:
—
Mas Bardoso causou o desemprego de vocês e vendeu os bens do estado para
continuar no poder!
E
a massa: Mulla, Mulla.
Torquemada
esfregou as mãos de satisfação e deu o veredicto final: - Crucifiquem-no!
No
Gólgota, Mulla suspenso nas traves do madeiro entre dois ladrões.
Do
lado direito, Valerius, o bom ladrão. Do lado esquerdo, Delubius, o mau ladrão.
Delubius,
o mau ladrão, implora:
—
Mestre, se tu és mesmo o Messias, livra-me dessa cruz, pois tudo o que roubei
foi para eternizar o seu reinado.
Valerius,
o bom ladrão, suplica:
—
Mestre, tudo o que tomei emprestado foi porque acreditei em ti, lembra-se de
mim quando entrares no teu reino.
Mulla,
o falso Messias, dirigindo-se aos dois ladrões:
—
Na verdade, na verdade vos digo: “Hoje mesmo estarão comigo no inferno.”
Acordei
suando, sentei-me na cama e tentei entender o sonho perturbador.
Nenhum comentário:
Postar um comentário